quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

MULHERES ENCANTADAS



Quem não conhece essa imagem?
O final feliz de Cinderela, quando ela calça o sapatinho de cristal, deixa de ser a gata borralheira, casa-se com o príncipe e vive feliz para sempre. Antes disso as duas irmãs tentam desesperadamente calçar o bendito sapato sem obterem sucesso. Tudo por um final feliz (um marido).
Na vida real, quantas vezes forçamos a vida a se encaixar nos nossos sonhos, numa tentativa absurda de buscar a felicidade? Quantos de nós já não forçaram a barra de uma situação acreditando (ou querendo acreditar) que aquilo fizesse parte do nosso destino?
É duro admitir mas algumas coisas simplesmente não existem para serem nossas... Outras fazem parte do nosso destino apenas por um período, sejam amigos, namorados, trabalho, lugares, sensações, emoções.
Forçamos a barra por uma petulância humana em acreditar que sabemos o que é melhor pra nós, ainda que todas as situações indiquem o contrário. Queremos que aquilo de certo, mesmo que seja na marra. Não importa se for na base da mentira ou da dor.
Alguém já pensou o quanto deve ser difícil andar, dançar ou viver calçada com um sapato de cristal?
Ele é duro, não transpira, deve ser pesado... Porque um sapato de cristal? Porque não de flores, de nuvem, de luz? Pode parecer só um elemento lúdico da história inocente da menina sofrida que é abençoada com o sonho que se encaixa, mas o elemento escolhido me faz pensar.
Mesmo quando os sonhos se encaixam os problemas não cessam. Quando você encontra o trabalho dos seus sonhos, você ainda terá que lidar com um chefe, com horários, com responsabilidades maiores que você. Quando você encontra o amor da sua vida ainda terá que encaixar personalidades, desejos, objetivos de vida. Passar na faculdade desejada não diminui o peso do percurso até a profissão. E assim por diante.
No mundo real é nossa obrigação saber que as coisas não possuem um final feliz "para sempre". Um período sim, um momento sim, mas "para sempre" nunca.
Então o sapato não serve para ninguém.
As vezes ele vai causar bolhas dolorozíssimas. As vezes o inteligente será andar descalço, deixar as bolhas cicatrizarem, deixar os pés livres e simplesmente viver os sonhos que forem nos envolvendo naturalmente. Ser levado à um emprego melhor, à um lugar melhor, um amor saudável, sensações boas, tudo sem forçar.
A bendita frase: eu te avisei, fica muito pior quando vem de dentro pra fora. Quando foi sua intuição que ficou gritando dentro da sua cabeça enquanto você forçava o sapato de cristal a servir de qualquer jeito.
Tudo isso, é nossa tentativa de controlar as coisas. E na verdade, não controlamos nada.
Calçar o sapato de cristal não garante nada além de muita dor no pé.


quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

MULHERES QUE SOBRAM



Fazemos opções nossa vida inteira, desde a mais tenra idade. 
O que vestir, o que comer, o que estudar e onde, o que ser quando crescer, quem namorar, em quem acreditar, quando ir e quando parar, onde morar, transar com qual idade, quais amigos escolher, em que arriscar, casar ou não, ter filhos ou não, ficar com os pais ou morar sozinha, trabalhar numa empresa ou ter seu próprio negócio, quando dizer sim e quando dizer não, e por ai vai. 
Fazemos as escolhas baseadas nas nossas convicções (ou na pressão da sociedade), mas acreditamos estar fazendo as escolhas certas. Em família, cada irmão opta por determinados caminhos e lá na frente alguém sobra. Geralmente é aquela (e) que optou por ser solteira (o).
Como se fosse uma punição (o que não deveria ser) a (o) irmã (o) que escolheu ser solteira, não ter filhos, viajar, ser livre, fica com a responsabilidade de cuidar - sozinha - dos pais. 
"Sobra" para ela ou ele a responsabilidade que deveria ser de todos os filhos. Mas como se fosse natural, o discurso mais corrente é que você tem tempo livre, não tem filhos, pode ficar com eles, levá-los ao médico, atender qualquer pedido de socorro a qualquer hora e qualquer dia, sem contar que por não ter família você só pode ter mais dinheiro.
Perai... O solteiro também paga luz, água, telefone, também faz mercado, vai a feira, precisa cuidar da sua casa, lavar roupa, passar (argh), ir ao banco, e tudo isso sem ajuda de ninguém, sem dividir as tarefas. Porque teríamos mais tempo livre? Não seria o contrário?
Quando nossos irmãos jogam na nossa cara esses argumentos, usando de artifícios mesquinhos para nos culpar da nossa suposta ausência, não seriam eles os culpados de abandonar nossos pais?
Conheço uma dezenas de mulheres que ficaram com essa responsabilidade e se culpam.
Se culpam por se sentirem cansadas e irritadas com essa situação. Um conflito emocional muito grande por que querem fugir dessa obrigação, e ao mesmo tempo não se sentem capazes de negar ajuda aos pais. 
A questão é quem abandonou quem.
Se os pais cuidam de até 10 filhos, por que 10 filhos não podem cuidar de 2 pais?
O abandono dos idosos está cada vez pior e a desculpa dos jovens é de que a vida está muito corrida. Imaginem agora com esse novo panorama de que nós teremos que trabalhar até os 90 anos para se aposentar. E como será a relação de filhos com pais idosos que só terão aposentadoria tão tardiamente?
É muito desgastante física e emocionalmente você ficar responsável sozinho pelo bem estar dos seus pais. Ser cobrado pelos seus irmãos que se negam a contribuir por puro egoismo, essa é a verdade. E a contribuição não significa só dar dinheiro, mas dar atenção, fazer um carinho e estar presente.